26 junho, 2008

O Estalo (ou Já que ela não tem um blog...)

...Seu olhar se dirige a uma cena que parece querer juntar esses dois mundos. Uma criança no colo de alguém do lado de fora, na chuva, se agarra a essas grades e não parece querer soltar. Do lado de fora, tentando penetrar nesse arco de proteção que o separa de um mundo a qual não pertence, essa criança (ou qualquer uma) não entende posições ou diferenças, portanto diferentemente de todos que passavam sem se importar com o que acontecia, ela percebe que há outra realidade, assim como há alguém do lado de dentro da grade, que consegue ver a sua. E é esse mesmo menino de colo que transpõe uma barreira que protagoniza a cena mais inesperada para o momento e lugar que se encontra: ele sorri de uma folha que estala na árvore. E há três elementos a serem comentados nesse verso. Primeiro, o fato de alguém sorrir, o que significa uma reação de alegria, ação essa que parecia impossível diante de todo o cotidiano das pessoas relatado no poema. Segundo é o fato de alguém notar, em meio a tanto caos e confusão, a árvore, elemento esse esquecido e ignorado por qualquer morador de grandes cidades. E terceiro, o fato de alguém sorrir de algo que acontece a todo o momento em qualquer árvore, o estalo de uma folha, um episódio tão corriqueiro que nem contemplamos da forma como deveríamos.
Karla Ribeiro
trecho do ensaio sobre o poema "Arco de Proteção"
de Heitor Ferraz

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