13 dezembro, 2011

Cidade dormitório



O ar rarefeito
ruas mal iluminadas
semblantes enuviados
uma incomum quietude

o desamparo coletivo aplacava meu caminhar
quando então você chega na lembrança
o seu perfume se fez passar
o teu sorriso me fez fechar os olhos

uma vez brigamos feio
e o soco dela fez um corte na minha boca
o sangue encharcou-a
nos beijamos e fizemos amor

ok, não foi nada disso
é que eu preciso escrever um poema
estou quase terminando
mas pensar nela me distrai



20 outubro, 2011

Para a garota desconhecida



Ela entrou na estação seguinte
sentou-se ao meu lado
colocando-me num estado febril
foi o suficiente

já não existia ordem lógica em meus pensamentos
fiquei estranho
não sabia que ainda era capaz de ficar assim
insuficiente

esbocei murmurar
gostaria que ela notasse minha displicência
tinha três ou quatro perguntas para lhe fazer
mas não fiz nenhuma

tive uma idéia melhor
tirei meu bloco de anotações
e comecei a escrever-lhe um poema
foi aí que ela notou que eu existia


11 outubro, 2011

Degelo



Preciso pensar em outra coisa
disse ele de si para si
sabia que se continuasse pensando nela

não conseguiria dormir

teve medo de ir ao interruptor
ela poderia surgir
mesmo assim saiu da cama e acendeu a luz
a madrugada se despedia

foi até a cozinha e bebeu leite no gargalo
foi até a janela e fumou um cigarro
no banheiro lavou o rosto sem sabão
não estava só ao mirar seu reflexo no espelho

era ela
que fora atraída pelos seus pensamentos
o cheiro de perfume envolveu toda a casa
o mesmo que ela usara no dia de sua morte



02 setembro, 2011

Escada de emergência



Ela está no final do corredor
chego por trás, pego-a pela cintura
beijo a sua orelha
desço até o seu ombro e mordo

sinto com a mordida
ela gemer e se arrepiar
então, da cintura, minhas mãos sobem
passeio pelo seu corpo até chegar nos seus seios

aperto com voracidade e suavidade
viro-a para mim e lhe dou um beijo demorado
puxo os seus longos cabelos
giro-a de costas para mim novamente

empurro ela contra a parede
lentamente levanto sua saia
com uma das mãos ela escora a parede
com a outra, tira a calcinha



09 agosto, 2011

A feiticeira


Digo baixinho no ouvido dele 
vem cá, vem! me beija... 
viro de bruços 
ele morde minha orelha e depois o pescoço 

na minha vez, deslizo a língua em suas costas
involuntariamente massageio-o com os meus seios
tiro sua roupa bem devagar
me aproveitando de cada segundo do seu corpo

ele segura meus cabelos com força
sinto sua respiração
seus batimentos cardíacos
o calor do seu corpo

ele me beija tanto
que fico sem
ele também fica
sem ar


02 agosto, 2011

Miopia



Começou com uma inflamação
os olhos começaram a inchar
até que as pálpebras estouraram
ao dia, 5 litros de soro para não ressecar as retinas

passei a ter epilepsia devido a uma sociofobia
bastava olhar para alguém
e enxergava os crimes cometidos por ela
através do remorso ou de alguma auto-punição moral

enlouqueci, queria o suicídio
mas fui aprisionado
mantido vivo para uso governamental
disputado por grandes corporações

de segredo em segredo
passei de salvação à perdição
o número de assassinatos aumentou dez vezes
graças a um vídeo que publiquei no You Tube


26 julho, 2011

Fermentação



P
erdi a linha de raciocínio
desconcentrei-me
o vinho tinto marcou seus lábios
me induzindo a uma hipnose

meu poder cognitivo se foi
acho que até mesmo Aristóteles
não entenderia a lógica desses versos
talvez a razão tenha ido fumar um cigarro lá fora

para piorar, as luzes dos automóveis
rompiam o vidro que nos separava da rua
encharcando sua pela branca
evidenciando suas bochechas rosadas de embriaguez

um gole
uma risada roxa
também ri
era o meu argumento



22 julho, 2011

Supercílio



Notei que vinha em minha direção
precisava anotar
a noite chegava
era novembro

ela tinha escoriações no rosto
claro que percebeu que a encarava
e fez questão de me ignorar
não se dobraria

lhe perguntei
onde ficava a rua tal
e também as horas
"acho que vai chover"
ela riu. não iria chover

ri também, pois não sabia mais o que dizer
ela tinha um sotaque
parecia ser de longe
distante


18 julho, 2011

Liquidez


Sou um arquivo para download
é só clicar
encamado por um revertério
meio aquilo proposto por Zigmunt Bauman

mais que um cidadão pós-moderno
preciso de ereção e beijo na boca
se o meu cigarro chegar até o filtro
não tem problema, acendo outro

nós dois temos um prazo de validade
semana passada, na sua última ligação
disse um discreto “até breve”
um contra-fluxo

na prateleira posso escolher
idade, cor dos olhos e altura
uma paixão passageira
uma fragilidade coletiva


17 julho, 2011

Antroposofia



Minha memória às vezes falha
simplesmente deixo de lembrar
a janela ficou aberta num dia de chuva
cenário para um sonho

substitui os comprimidos pelo retrato dela
homeopatia que nada
o sofrimento purifica
sentir sua falta me deixa parado no ar

o acaso
um deslocado enlouquecido
descolado e destoado
mais um pouco e desabo

não sei como começou
como foi mesmo?
ah sim
foi sorte eu acho



08 julho, 2011

A.V.C.


Dia turvo
mente torpe
trote torto
um tropeço

a linha reta me desafia
o sol de inverno me engana
o corrimão é solidário
a padaria não tem trocado para o pão

se você disser que sim
eu acredito
se você me abandonar
eu resisto

meus joelhos encontram o chão
desencontros na Plataforma 3
o que tenho no estômago sai
a solidão fica



05 julho, 2011

Difusora


Ela deve ser uma das últimas a fazer isso
sintonizar o rádio girando um botão
um olhar analógico

um sorriso orgânico

auto-falante empoeirado

um pouco de chiado
deve ser uma guitarra tocando Hey Joe
ou uma voz rouca sussurrando Summertime

ela depara-se com o botão mono/estéreo
não deve funcionar
na ponta da antena tem um pedaço de palha de aço
não deve funcionar

acende um incenso, me oferece vinho
no brinde penso em sexo
ela diz: pela paz mundial
dá no mesmo



30 junho, 2011

Substantivo coletivo


M
e lembrei
o quanto estranhava
e não estranho mais
a multidão nos coletivos

me incorporei a ela
e quando dou por mim
já estou no trabalho
esperando dar a hora de ir embora

o que era um encantamento diário
com o sol, as pessoas e simples objetos
agora é o relógio
o tempo, o tempo, tic-tac, tic-tac

me lembrei
como era estranho o mundo
agora estou nele
até o pescoço


29 junho, 2011

Estiagem


Já fazem dois anos que não chove
mentira
vez ou outra bate uma tempestade
mas é só

não compreendo o caos em que me tornei
mirabolando estratégias
desenhando cálculos
equacionando frases

os rios que correm em minhas veias secaram
propagando uma revolta
os batimentos cardíacos pegaram em armas
estão prontos para uma revolução

mas foi encaminhada uma forte repressão
convocaram a elite etílica
e foi propagandeado folhetos da ressaca
minh’ alma é reacionária


25 junho, 2011

Sem o manual de instruções


C
omeça você
não suporto está pagina em branco
o quanto dói, uma pagina em branco
o que ela diz?

não sei por onde começar
me expor
bate uma frustração
merda de vida vazia

e depois disso
dou de cara com ela
me diga
devo chorar?

me lembro de uma antiga canção
representava algo
acho que representa
um caco de vidro



20 junho, 2011

Cigarro mentolado


A
tempestade passou por aqui
devastou tudo
imaginava que ela fosse uma senhora
mas não, tem vinte e poucos anos

os olhos dela me causaram hipotermia
estou desabrigado
alojado numa escola pública
a inundação ainda permanece

ela chega, ela vai
de Santo Amaro até Pirituba
tudo é asfaltado
a cidade é impermeável

agora estou entre o guardirreio e a pista
batucando na estrutura de metal
canto um samba antigo que não lembro a letra
mas é bacana cantarolar



16 junho, 2011

Um erro ocorreu em nossa base de dados


E
então amanhece
ela avisa que tem uma neblina linda lá fora
arregala os olhos
peço pra ela voltar pra cama

mas o café vai esfriar
toma
ficou bom?
fiz torradas também

ela pulou em cima de mim
não a deixei sair mais
o café esfriou
as torradas também

quando levantei já não havia neblina lá fora
coloco Verano Porteño para tocar
Piazzolla parece sempre triste
mas não foi assim desta vez



11 junho, 2011

Paredes brancas


Sou dono de dois hotéis na Boca do Lixo
também protejo as putas
em troca os primeiros programas são da casa
e nos demais ganho uma porcentagem

meu avô foi vereador
da – não mais – cidade de Santo Amaro
ela foi incorporada à capital paulistana
uma retaliação por aderir a Revolução de 1932

meu pai ganhou uma boa herança
mas perdeu tudo no jogo
o pouco que me restou
abri uma agência de motoboys

tive três filhos
eles me largaram nessa clínica
tento me curar do alcoolismo
aqui o tempo é sempre o mesmo



07 junho, 2011

Nosso amor é radioativo


Pode pesquisar no Google
estamos a beira de um colapso
um fenômeno da física nuclear
átomos, prótons e nêutrons enlouqueceram

sofro um processo de desintegração
talvez pela situação de isótopo que me encontro
um pouco de raios alfa, beta ou gama cairiam bem
sinto danos no sistema nervoso central

temo pela minha inflamabilidade
por isso irei me entregar as autoridades
o meu caso será estudado
partes do meu corpo estarão por aí

nada mais do que justo
pois não me sinto muito inteiro
por isso acho melhor uma recomposição imediata
para que não leve tudo pelos ares



04 junho, 2011

Para a menina que mentiu a idade pra mim


V
ocê não torna a me ligar como antes
não retorna minhas mensagens
entorna agora em outro lugar
fora desse entorno

meu travesseiro ainda tem seu rímel
meus pensamentos ainda te reproduzem
você levou minha melhor blusa de lã
agora sou eu quem reclama desse inverno

rimos bastante
rimamos pouco
rímura que se abriu
rímel que desencadeia versos

tiro a poeira do tempo
só pra você abrir novamente a porta
provavelmente quando você voltar de verdade
a roupa de cama já deverá estar trocada


03 junho, 2011

Praça Floriano Peixoto


As ciganas
vivem ziguezagueando pelo meu caminho
pedem para a ler a mão das pessoas
menos a minha

elas andam com vestidos coloridos
cada uma com uma cor
são bem chamativas
amarelo, verde, rosa

quando sorriem
dá pra ver os dentes de ouro
reluzem
sorrio também

fico olhando pra elas
como quem diz
"lê a minha! lê a minha!"
mas pra falar a verdade tenho medo


01 junho, 2011

Apologia


C
heirava e beijava todos os seus poros
todos os seus orifícios
decorei em tempo recorde
as maneiras com que ficava arrepiada

girava e girava-a sem descanso
puxava seus cabelos
descompasso
passo a passo

fiz um pedido
“me morde”
ela se fez de desentendida
abriu os olhos

percebi que se passou algo
comigo e com ela
não fomos os mesmos desde então
nunca mais



Lista de diretores


Carne Trêmula, Má Educação, Fale com Ela
Manhattan, Hannah e Suas Irmãs, A Era do Rádio
O Iluminado, Barry Lyndon, 2001
Taxi Driver, Touro Indomável, Os Bons Companheiros

Cães de Aluguel, Pulp Fiction, À Prova de Morte
Um Corpo Que Cai, Janela Indiscreta, Psicose
Morangos Silvestres, A Fonte da Donzela, Persona
Apocalypse Now, O Poderoso Chefão, Cotton Club

Tempos Modernos, Luzes da Cidade, O Grande Ditador
Chinatown, O Bebê de Rosemary, O Pianista
Homem Elefante, Cidade dos Sonhos, Coração Selvagem
Último Tango em Paris, Os Sonhadores, Último Imperador

Cidadão Kane, A Marca da Maldade, O Processo
8½, A doce Vida, Satyricon
Uma mulher sob influência, Faces, Noite de estréia
Fargo, Gosto de Sangue, O Grande Lebowski



29 maio, 2011

Bloqueio


V
im aqui com um objetivo
falar algo importante
algo sério
fundamental

mas as idéias me escaparam
se diluíram
era talvez quase isso
ou um pouco mais

no silêncio me calo
percebo nitidamente todos os barulhos
as letras se misturam
formiguinhas e farelos

mas vamos lá Cícero
concentração, amigo
você não tem muito tempo
não tem



25 maio, 2011

Antígona (fim da trilogia)


Fui os olhos do meu pai no deserto
ajudei-o a sobreviver ao abandono
agora tenho que cumprir mais um designo
sepultar meu irmão Polinice

isso seria contrário as leis tebanas
mas não me importo
preciso soterrar esse último amor
para que outros possam vir

outra maldição arrebata a prole de Édipo
mas é preciso resistir
quem me guia é a paixão
é a intensidade do agora

e por acreditar nesse ideal
meu destino está traçado
com a solidão
e a morte

24 maio, 2011

Eurídice


Minha lira está mais triste
o veneno de uma serpente
levou minha amada até Hades
no Mundo dos Mortos

irei até lá se preciso for
nem mesmo essa distância
me impedirá de reavê-la
transporei todos os quilômetros

escutem esses acordes
toco mais forte agora
é para que ela possa ouvir
seu lugar é aqui ao meu lado

caso a perca para sempre
vou entregar-me às bacantes
que cravem suas unhas e dentes em mim
e não mais olharei para trás



23 maio, 2011

Medéia


Oh, Jasão
depois de tudo o que passamos
sinto um gosto de abandono na boca
ainda guardo o seu olhar comigo

fui expulsa da cidade que nos acolheu
agora sou uma eterna estrangeira
maldito seja Creonte
que me impôs este exílio

o que mais me enlouquece é o teu silêncio
a saudade da sua voz me cala
a cada segundo que passa
dois parecem voltar

venham cá crianças
nossa, como são iguais ao seu pai
mamãe tem algo para vocês
não me olhem assim, não vai doer nada



22 maio, 2011

Vinho, óculos, mesa


S
obre a mesa
um guardanapo borrado de batom
um óculos com marcas do mesmo
e o gosto de vinho tinto nos lábios

o estalo dos beijos
as pessoas lá fora
as tatuagens do seu braço
gritos abafados

não tenho coragem para olhar no retrovisor
mas olho mesmo assim
não te vejo mais
é esquecer da saudade que está por vir

é a covinha que me faz sorrir
e o vinho às 17h
nós...
por aí



pro Cícero publicar
com todo amor!

http://prepsicopata.blogspot.com/

20 maio, 2011

Recall


Cupido Group do Brasil Comércio Ltda
convoca as Marias
proprietárias de um João qualquer
pois estes tem apresentado um grave defeito

eles se apegam facilmente
erro gravíssimo
esta iniciativa visa assegurar
a máxima satisfação das nossas clientes

garantindo a qualidade
a segurança
e a confiabilidade de nossos produtos
troque-o o quanto antes

clique no modelo do seu João
em caso de dúvidas
ligue para nossa Central de Atendimento
estaremos prontos para atendê-la pelo 0800 703 703



19 maio, 2011

Deixe-me guardar este segundo


Faça um pedido e sussurre-o para mim
disse ela, com o mesmo sorriso de sempre
se te contar ele não se realizará
disse eu, com o mesmo ar de preocupação

seria tão mais fácil se eu retomasse a minha vida
tão mais simples se eu te esquecesse
mas agora você povoa meus pensamentos
flashes

os ponteiros giram
os versos se desencontram
as músicas ficam mais tristes
o cigarro queima sem ser tragado

agora alterno tristeza e alegria
vem aí uma enxurrada de poemas para o Nada Rima
me desculpem os leitores
se tranço as pernas embriagado por aqui


Aeroporto JK


Desembarquei
e você veio ao meu encontro
estávamos fora do horário
só um pouco

estamos na mesma cidade
a Terra girou várias vezes para que isso acontecesse
você tem noção?

tem?

cara, a Terra
fica aí girando
enquanto seguimos nossas vidas
isto é, tentamos

penso nisso tudo
descendo a escada-rolante
finalmente te encontro
finalmente um beijo


17 maio, 2011

Brincando no meio-fio


Levanto a gola da minha jaqueta
para que a garoa não pingue na nuca
os ombros levantados
andar seco

na minha cidade
as noites ficaram mais escuras
e o frio não da trégua
como um soco direto no estômago

estava demorando para perder a fé
poderia tentar lutar mais um pouco
mas ao relento me entrego
desiludido pelo sonho do possível

“é cara, você não tem chance!”
um voz me guia para o bar
whisky e jazz em plena terça-feira
no celular, duas chamadas não atendidas



Imobilização


Quando abri os olhos
sorri
6h06min
ela estava ao meu lado

sonolento, acariciei seus cabelos
até que ela despertou
sonolenta, me abraçou
colando seu ouvido ao meu peito

bom dia
na verdade não
entendi que tudo aquilo
era uma despedida

o movimento para abrir as cortinas foi interrompido
nos protegemos da claridade
naquele quarto de hotel
fizemos de tudo para esquecer o mundo lá fora



16 maio, 2011

Plano piloto


Peguei o ônibus na W3
o combinado era encontrá-la na L2
mas me distraí fazendo um barquinho de papel
deixei-o com a senhora que estava ao meu lado

desci no ponto seguinte
noite fria
a lua como testemunha
passos apreçados

chegamos ao mesmo tempo
ela, mais bela do que nunca
correu em minha direção
pulou e me abraçou

dei dois ou três giros no ar
ela me puxou pela gola e me beijou
trazia algo em sua mão
um barquinho de papel



Não aqui


Frente a frente
espero que ela fale alguma coisa
e com a mão no queixo e o cotovelo na mesa

me diz que estou muito quieto

eu não sei o que dizer
espero ela terminar o jantar, meu prato já está vazio
em sua taça deita o último gole
uma estratégia

ela gosta de carménère
por isso não pedi cabernet sauvignon
no arremate ela fechou os olhos
os vinhos aqui estão a uma temperatura de 17º

decodifico o seu sorriso
levanto a garrafa e digo mudamente para o garçom:
mais uma
tínhamos pressa, não temos mais


10 maio, 2011

Desdobramento


Espirrou sangue pra todo lado
um golpe certeiro na cabeça
parte do cérebro saiu junto com a mandíbula
o tronco inflou, expondo alguns ossos da costela

me livrei do corpo
mas o acontecido se repetia nos meus sonhos
ora ao som de Charlie Parker
ora ao som de Ravi Shankar

passei a ver vultos
sempre de relance
nas portas e nas janelas
dentro do ônibus, dentro do metrô

um dia vieram tirar a minha vida
dois homens, duas facas
resisti, mas não por muito tempo
afoguei-me com o sangue que saia da minha boca


03 maio, 2011

Em pessoa


T
emos o poder de transformar o tempo
gira-gira-gira-gira
depois de dez anos estou de volta
você só me conhece por fotografias

nossa conexão foi imediata
quando percebi já era tarde
sou indeciso
mas com você foi diferente

quando caiu de bicicleta
não estava aí para passar mertiolate no seu joelho
e se jogo esses versos aqui em quartetos
foi porque à eles fui lançado

me arrependo
mesmo dizendo aos outros que não
agora sobrevôo nossa cidade
finalmente estou voltando



27 abril, 2011

Vincent Price


Desperto, o teto na penumbra
giro, deito de bruços
cerco meus olhos com o travesseiro
sinto meu rosto formigar

na verdade tem algo vivo nele
algo querendo sair
caio no chão, bato a cabeça no armário
um ruído horrível

alguém abrindo cascas de amendoim
se digladiam
a fronha se rompe e elas fogem
se espalham, parecem estar famintas

a porta do quarto não abre
escuto novamente o barulho
mais alto, ensurdecedor
está vindo do colchão king size


25 abril, 2011

Burj Dubai


E de repente
imagino que essa poderia ser ela
essa outra também
e mais essa

talvez fosse
resolvo perguntar
ela sorri
diz que sim

pergunto para outra
que balança a cabeça positivamente
é verdade, reconheço-a pois seu rosto não existe
é um borrão

reparo que o coletivo tem asas
as rédeas do monstro são puxadas, se enfurece
pousa no prédio mais alto da cidade
o bicho faminto devora todos os passageiros



21 abril, 2011

Quem tem medo de Virgínia Woolf?


Para os desavisados
estou enlouquecendo
para os que me conhecem
sempre fui louco

perdi mesmo o senso de razão
podem me internar
uma temporada
uma primavera

quero tomar sedativos
fazer terapia
dinâmicas de grupo
choques elétricos

depois disso estarei curado
vou casar e ter filhos
sorrir na Europa em fotografias digitalizadas
vencer na vida, pois a catarse é morrer


19 abril, 2011

Quebra cabeça


Você tem essa mania
se esconde de mim
me mostra a lua
e o Lago Paranoá

porém,
veste com gosto esse véu
só me é permitido ver os seus olhos
deve ser tradição de família

carrego explosivos
na mão direita uma flor
para o caso de um Revolução
estaremos na linha de frente

por favor,
me deixa te desnudar
antes que o exército inimigo chegue
vamos saborear a Liberdade



18 abril, 2011

Arranjo


O maestro entra em cena
todos de pé
é o que sempre acontece
quando ela desponta no horizonte

nos seus cabelos
deslizam os arcos
a melodia do violino e a tessitura do violoncelo
desmancha o coque como o arpejo de uma harpista

quero tocar seus lábios
como num oboé ou clarinete
te deixar sem ar
me deixar sem ar

acaba o primeiro movimento
desavisados batem palma
o entusiasmo ecoa na plateia
auto-controle é algo raro em mim



14 abril, 2011

Estação Grajaú


A
claridade da manhã
chega sem misericórdia
invade a estação
enquanto desço a escada rolante

quero sair deste vagão
muitos querem entrar
as palavras me empurram
minha lapiseira me puxa

há, essa claridade impiedosa
é a mesma que te faz sorrir
quando abre sua janela
é assim que imagino nosso encontro

nossa maluquice
ficaria boa em qualquer poema
pois quero que saiba
que não há nuvens no céu


12 abril, 2011

Offline


A
s estrelas
são o meu protetor de tela
as paredes
pulverizadas quando escuto sua voz

você desliga o telefone
economizamos no interurbano
eu saí no prejuízo
pois ainda tinha algo a dizer

e o que eu não disse
você não precisava dizer, mas disse
melancolia só é boa em poemas
no cotidiano ela é só amargura

a minha disfarço numa folha de papel
mesmo que seja uma tela de computador
quando digo que te quero
te quero mesmo


Não adianta fincar os pés


No dia seguinte
parecíamos dois estranhos
ela levantou sem dizer uma palavra
eu não tive coragem para tanto

fez o café
colocou na minha xícara
até transbordar
escorreu pela mesa

não abriu as cortinas
nem as janelas
o café esfriou
não abriu o jornal

voltou para a cama
e desatou a chorar
saí na ponta dos pés sem me despedir
não imagino a dor de sua perda



11 abril, 2011

Brincando com os pêlos do seu corpo


Me mordeu no pescoço
puxou meus cabelos
apertava meus seios em desespero
o meu batom estava por todo seu rosto

não queria que parasse
e quando ameaçava fazê-lo
sussurrava para continuar
e ele continuava

eu estava exausta
ele também
isso durou mais algumas horas
e foi assim durante uma semana

no aeroporto lhe comprei uma garrafa de vinho
se embriague, eu disse
nos abraçamos
a eternidade nunca foi tão cruel



10 abril, 2011

Faça um pedido


Saio de casa
esqueço as janelas abertas
não estou aí para dizer o que sabe
o silêncio impera durante o dia

chega a tarde
sufoca minuto a minuto
olho o relógio
sufoca minuto a minuto

a lua atente ao meu pedido
e surge preguiçosa
chegando em casa
vejo que a porta está aberta

é você
chegou sem avisar
mas pelo visto está de saída
vai levar um bom tempo para eu me acostumar


08 abril, 2011

Duas sacolas de plástico para as cervejas


Certas coisas tomam desdobramentos estranhos
parecem labirintos
sem nenhuma migalha de pão
para marcar o caminho

Ariadne e Teseu
nunca se perderiam em Santo Amaro
ela é o novelo
e sua presença destoa e ilumina

Dédalo aqui se sentiria em casa
ladeiras e bifurcações
boates e igrejas
ambulantes no metrô

daqui do quarto andar
ninguém se esbarra
uma piscadela
e ela não está mais lá



07 abril, 2011

Tranquilidade quebrada


Tonalidades de azul escuro no céu
perto do cinza
frio abafado
a umidade invade os pulmões

acordei meia hora mais cedo
resolvi ir caminhando para o trabalho
péssimo dia para isso
desabam as constelações

o esforço de semanas
reduzido a borrões
se esfarelam
diluem

corro para um ponto de ônibus
pego o primeiro que aparece
não sei para onde vai
espero que para bem longe



05 abril, 2011

Eu me viro, sempre me viro


Calma, calma
me tenta, você
uma procurada
atrás de uma cifra que eu escrevi

eu pego os versos e alguns acordes
pra ti, esse novo
na verdade era um desses versos de acordes
mas encaixou tão bem

provavelmente eu olharia pra você na rua
e o que não se fazia antes
se faz depois
isso me alivia

gosto do teu impulso
impulso é uma palavra tão sexy
acho que a maioria das palavras que tem r eu gosto
força, sussurro, suspiro, surto


Falta muito pouco


C
huva na estrada
retomo a atenção
preciso que parar de me distrair
posso causar um acidente

as cidades passam rapidamente
minha velocidade redobrada
não faz nenhum sentido
agora essa estiagem

posto de beira de estrada
bem fuleiro
peço um café
o copo americano vem molhado

do bolso da calça jeans tiro sua carta
nela tem um mapa
observo a distância que nos separa
parece pouco agora



04 abril, 2011

Brasília


Surge do nada
de outra cidade
com sua enorme mochila
entra no vagão do metrô

ajudo em desequilíbrio
esbarro nas pessoas
ela sorri, agradece
peço desculpas

me pergunta algo
aponta no mapa
não sei onde é
mas me esforço para dizer algo

é na próxima estação
não deveria ter dito isso
mas disse e ela vai
sem nenhum aceno

03 abril, 2011

Garrafa de vinho


Mudou o destino daquela garota
lábios e dentes levemente escurecidos
sua cabeça girava
não parava de sorrir

tinha um plano
sempre tinha um
realizava todos
mesmo que em sonhos

transmitia sua alegria por telepatia
alguém numa cidade
bem lá longe
poderia captar sem precisar de parabólica

escreveu um bilhete
voltaria em alguns dias
talvez meses
o sol brilhava muito naquela manhã

08 fevereiro, 2011

Vou esperar do lado de fora


Não estava muito atento
e quando dei por mim
estava chegando ao meu destino
não estava mais dando voltas

a noite abafada
me fazia parecer doente
a cidade querendo adormecer
as luzes já sonolentas

às vezes
quando chego
no meio do poema
não sei para onde ir

o cobrador me deu uma dica
na verdade, um alerta me cutucando
chegamos no fim da linha
é preciso descer


20 janeiro, 2011

Minhas escolas


Nº Unidade Escolar Endereço Bairro Telefone

2 EE Adolfo Casais Monteiro, Prof. Av. Manuel Alves Soares, 659 Sítio Jabuticabeiras 5661-6078 5661-1392

4 EE Afrânio de Oliveira Rua Giuseppe Tartini, 818 Jardim Icaraí 5928-2088 5928-1747

15
EE Belkice Manhães Reis, Profª. Rua Jane Vanine Capozi, s/nº Cidade Nova América 5978-4156 5978-4480

17 EE Calhim Manoel Abud Rua Oscar Fernandes, s/nº Jardim Veneza 5523-7692 5681-5381

20
EE Carlos Ayres, Prof. Avenida Dona Belmira Marin, 595 Parque São Paulo 5928-2521 5928-7884

29 EE Condomínio Carioba Recanto Marisa Rua Quatro, nº 100 Jardim Verde 5932-6060 5932-6363

33 EE Duarte Leopoldo e Silva, Dom Avenida de Pinedo, 555 Socorro 5685-4311 5522-1861

34 EE Emílio Warwick Kerr, Pastor Rua Walter Sgarbi, 700 Jadim Reimberg 5928-1336 5928-6415

37 EE Esther Garcia, Profª. Avenida Antonio Carlos Benjamin dos Santos, 858 Jardim Edda
5928-4836 5972-3243

45 EE Herbert Baldus Rua Canção da Terra, 100 Jardim São Bernardo 5928-0280 5971-7358

52 EE Itúrbides Bolivar de Almeida Serra, Prof. Avenida de Pinedo, 777 Socorro 5681-7006 5523-5917

59 EE Jardim Varginha II Rua João Honório Caixeta, 182 Jardim Varginha 5938-2452 5938-2453

69 EE José Geraldo de Lima, Prof. Rua Antonio Mariano, 254 Vila Nova Friburgo 5686-9008 5522-5655

79 EE Loteamento das Gaivotas III Rua São Paulo, 53 Jardim das Gaivotas 5933-4713 5933-4973

103 EE Santo Dias da Silva Rua Alfredo Cortes, 32 Jardim Maringá 5661-0943 5661-1988


07 janeiro, 2011

Top 10 - filmes 2010


1 - O profeta - Jacques Audiard

2 - Beyond - Pernilla August

3 - O segredo dos seus olhos - Juan José Campanella

4 - Tropa de Elite 2 - José Padilha

5 - Ilha do medo - Martin Scorsese

6 - A fita branca - Michael Haneke

7 - Abutres - Pablo Trapero

8 - É proibido fumar - Anna Muylaert

9 - Scott Pilgrim vs. the World - Edgar Wright

10 - Tudo pode dar certo - Woody Allen